quarta-feira, 6 de dezembro de 2006



'Esperar ou vir esperar querer ou vir querer-te
vou perdendo a noção desta subtileza.
Aqui chegado até eu venho ver se me apareço
e o fato com que virei preocupa-me, pois chove miudinho

Muita vez vim esperar-te e não houve chegada
De outras, esperei-me eu e não apareci
embora bem procurado entre os mais que passavam.
Se algum de nós vier hoje é já bastante
como comboio e como subtileza
Que dê o nome e espere. Talvez apareça'

Mário Cesariny. Estação

Às vezes parece que ainda te espero.. Às vezes parece que ainda te vejo de costas e corro a tapar-te os olhos .. Ainda te vejo emergir no meio dessa multidão de pessoas iguais.. às vezes ainda me arrepias.. às vezes ainda fico imóvel a ver-te partir no comboio.. "Desculpa ter ido embora logo ... Espera a próxima" rápido de mais.. à velocidade com que as fugazes ilusões se vão construindo e decaindo sem repararmos.... rápido de mais.. como desapareceste.. e não mais houve próxima como havias prometido.. às vezes ainda espero a próxima..

terça-feira, 5 de dezembro de 2006



"You are welcome to elsinore

Entre nós e as palavras há metal fundente
entre nós e as palavras há hélices que andam
e podem dar-nos morte violar-nos tirar
do mais fundo de nós o mais útil segredo
entre nós e as palavras há perfis ardentes
espaços cheios de gente de costas
altas flores venenosas portas por abrir
e escadas e ponteiros e crianças sentadas
à espera do seu tempo e do seu precipício

Ao longo da muralha que habitamos
há palavras de vida há palavras de morte
há palavras imensas, que esperam por nós
e outras, frágeis, que deixaram de esperar
há palavras acesas como barcos
e há palavras homens, palavras que guardam
o seu segredo e a sua posição

Entre nós e as palavras, surdamente,
as mãos e as paredes de Elsenor
E há palavras nocturnas palavras gemidos
palavras que nos sobem ilegíveis à boca
palavras diamantes palavras nunca escritas
palavras impossíveis de escrever
por não termos connosco cordas de violinos
nem todo o sangue do mundo nem todo o amplexo do ar
e os braços dos amantes escrevem muito alto
muito além do azul onde oxidados morrem
palavras maternais só sombra só soluço
só espasmo só amor só solidão desfeita

Entre nós e as palavras, os emparedados
e entre nós e as palavras, o nosso dever falar
"

Mário Cesariny


Onde estão agora as palavras que nos ligaram..? Essas através das quais nos descobrimos... nos entregamos.. nos desejamos... que julguei terem quebrado a distância entre nós.. Essas que não mais ouvi de tua boca, de teus dedos... .. Palavras que ainda teimo em tatuar em rasgos de memória.. que fluíram de teus dedos para estas folhas espalhadas na mia mesa.. as folhas que me asseguram que foste real.. que não me permitem te odiar.. Porque é que te fechaste neste silêncio gélido, asfixiante? Como pude não te ser suficiente? Porque não disseste adeus? Porque me privas de tuas palavras? Era tudo tão mais simples se eu te odiasse...